quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Congresso Internacional SIBiUSP 30 anos por Eduardo Graziosi Silva em Bibliotecas 2.0

O Futuro do Conhecimento Universal (I)

Ocorreu nos dias 7/10 e 8/10, em São Paulo, o Congresso Internacional SIBiUSP 30 anos: O Futuro do Conhecimento Universal. Contou com a presença de profissionais de diversas áreas e países que enriqueceram o evento com suas práticas, ideias, discussões e experiências, juntamente com as perguntas do público. Relatarei o evento em 4 posts, cada um apresentando cada mesa redonda.
A primeira mesa (O Futuro do Livro) foi coordenada por Mônica Rizzo Soares Pinto, Diretora do Centro de Referência e Difusão da Biblioteca  Nacional, representando o Presidente Galeno Amorim, que infelizmente não pode comparecer.
A primeira apresentação foi de Jean-Claude Guedón, da Université de Montréal/OAPEN (Open Access Publishing in European Networks), do Canadá. Intitulada “The future of the book: reshaping the sociology and the society of texts”, foram apresentados os interessantes conceitos de sociologia de textos, sociologia de documentos e sociedade de textos, que em linhas gerais abordam a questão de  que os textos devem ser analisados segundo seu tipo, sua maneira de produção e a época em que foram publicados.
Sobre o texto, Jean-Claude Guedón apontou que ele permite externalizar a memória e sofreu modificações durante a evolução dos suportes da informação (escrita cuneiforme, papiro, códex etc.). Porém,  esses suportes impuseram obstáculos, como no caso de tábuas de argila a necessidade de saber escrever e, no que se refere ao papiro, o domínio de técnicas específicas de escrita. A imprensa, por sua vez, determina não só o conhecimento da impressão, mas também influencia na decisão de publicar ou não um texto e, consequentemente, na circulação de ideias.
Ainda no que diz respeito à sociologia dos textos, Guedón expôs que sua modificação também provoca mudança em quem faz os textos. É o caso, por exemplo, da imprensa, que de controlada por poucas passou a ser digitalizada, por meio da proliferação de blogs, tweets, de link para link etc., configurando um novo jornalismo emergente. Embora Guedón apontou que a imprensa digitalizada seja de fácil navegabilidade, não concordo, pois nem todos os sites e ferramentas são desenvolvidos visando a organização e recuperação da informação, que muitas vezes são uma verdadeira dor de cabeça para os usuários. Nesse contexto, tutoriais podem ser uma boa solução para esclarecer a navegação, assim como um mapa do site ou até mesmo o e-mail do autor caso a resposta para uma dúvida não seja encontrada.
Destaca-se que na sociedade atual fomos transformados em autores e leitores, além de ser ressaltado, em diversos momentos, que os documentos não sobrevivem sem os grupos sociais. Há mudanças de papéis, as vezes sutis, as vezes não: passou-se de uma sociedade de textos para uma sociedade de documentos, de um sistema claro de distribuição para um sistema interativo. Sobretudo nesta era de conectividade, nem sempre é fácil fazer essas distinções, mas acredito que o mais importante seja transformar a informação em conhecimento, principalmente para “aliviar” um pouco o excesso de informação, contribuindo para a satisfação das necessidades informacionais dos usuários.
Sobre o futuro dos livros e do conhecimento, o palestrante fez três considerações:
1. Livros não serão transformados em Kindles.
2. A presença dos e-books será cada vez mais forte.
3. O autor está inserido em um ambiente novo e rico para essa nova sociedade e sociologia dos textos.
Jean-Claude Guedón encerrou sua fala reafirmando que o futuro dos livros passará pelas comunidades, pois elas irão reunir pessoas e livros com alguma organização e que o trabalho do bibliotecário passará dos livros para as pessoas, ou seja, tudo que possa ser feito com documentos por meio das pessoas.
A próxima palestra, “How to change copyright without changing the law: fair use and open access in the U.S.”, por Brandon Butler, da Policy Initiatives – Association of Research Library (EUA). Inicialmente, Butler expôs que as dificuldades enfrentadas pelos EUA em relação à lei de direitos autorais não são tão diferentes no Brasil e esclareceu que sua fala tomou por base a legislação americana.
Segundo o palestrante, o problema principal é que o futuro será governado pela lei, com exceção das bibliotecas, mas ainda assim uma exceção muito restrita. Embora atualmente os usuários desejem todo o conteúdo digitalizado, bem como que os livros sejam encontráveis e compartilháveis, Butler colocou que o sistema atual de publicação está quebrado; a solução, a princípio, seria mudar a lei. Porém, o grande problema enfrentado no Congresso americano é o argumento dos possuidores dos direitos que se colocam como criadores de empregos, além de deixarem em segundo plano outros atores envolvidos nesse processo, como usuários e bibliotecas, que se tornam “reféns” na medida em que o acesso depende da autorização dos detentores dos direitos. Os bibliotecários realizaram esforços no sentido que tornar a lei mais favorável para o acesso aos conteúdos, porém não obtiveram sucesso e também pelo fato de existir muitos lobistas no meio, segundo Butler.
No que se refere à educação a distância, Brandon Butler apontou a existência doTEACH Act, que permite aos educadores copiar documentos ou utilizar materiais sob proteção para uso em aula. Essa lei, infelizmente, não funciona para bibliotecas, que juntamente com o Congresso e bibliotecários, não conseguem chegar a um acordo para o uso dessas instituições. As soluções podem ser o Fair Use e o acesso aberto. Como este já é conhecido dos bibliotecários, limito-me a apresentar o conceito do Fair Use, que acredito ser uma novidade para mim e outros leitores e participantes do evento. Segundo a Wikipédia, é
“[...] uma limitação e exceção ao direito exclusivo concedido pela lei de copyright para o autor de um trabalho criativo, é uma doutrina na lei de direitos autorais dos Estados Unidos que permite o uso limitado de material protegido por copyright sem adquirir a permissão dos detentores dos direitos. Exemplos de fair use incluiem comentários, críticas, notícias, pesquisa, ensino, documentos de biblioteca e bolsas de estudos.”
Vale destacar que o Fair Use é baseado em quatro fatores:
O propósito e caráter do uso, incluindo se tal uso é de natureza comercial ou educacional sem fins lucrativos.
A natureza do trabalho com direitos autorais.
A quantidade e substancialidade da parte usada em relação à obra como um todo.
O efeito do uso sobre para um mercado potencial para ou o valor do trabalho com direitos autorais.
Nesse sentido, a Association of Research Libraries (ARL) está desenvolvendo um código para regular o uso dos materiais na comunidade acadêmica. Para tanto, foi realizada uma pesquisa que envolveu a conversa com pessoas para elencar os problemas, dentre eles: a falta de uma política específica para uso do livro quanto à cópia; suporte à pesquisa: digitalização de coleções e gerenciamento do acesso; exposições online; pessoas com necessidades especiais.
Já existem melhores práticas para uso do fair use, como é o caso de algumas comunidades com seus próprios códigos, como o Documentary Filmmakers’ Statement of Best Practices in Fair Use e o Librarians Code Research, cuja previsão de lançamento é para janeiro de 2012.
Em relação ao acesso aberto, Butler que esse modelo deveria ser parte do sistema de publicação e não apenas uma alternativa. Como exemplo mencionou o Scholarly Publishing and Academic Resources Coalition (SPARC), uma iniciativa desenvolvida pela ARL. Trata-se de “[...] uma aliança internacional de bibliotecas acadêmicas e de pesquisa trabalhando para corrigir desequilíbrios no sistema de publicação científica.”, conforme consta na página About SPARC.
Encerrando a mesa redonda, Roberto Bahiense, da Nuvem de Livros/Gol Grupo apresentou a palestra “Nuvem de livros – Democratização do acesso ao conhecimento”. A partir da pergunta “Porque as editoras estão postergando os e-books?”, o palestrante apresentou três respostas:
1. Síndrome do DRM (controle dos direitos autorais), relacionada com a preservação dos conteúdos para evitar pirataria.
2. O suporte da cadeia editorial poderia quebrar.
3. As editoras vão ter que terceirizar a tecnologia da informação?
Em seguida, Bahiense expôs alguns dados que refletem uma nova realidade brasileira, dentre eles: a Lei nº 12.244 – Universalização das bibliotecas escolares no Brasil, que prevê, até 2020, a existência de bibliotecas nas instituições de ensino e um livro por aluno, pois atualmente há 15 milhões de alunos sem biblioteca; o aumento do número de celulares, que já é maior que a população brasileira; o aumento da velocidade da banda larga e também do número de computadores.
Após essa breve exposição, foi apresentada a Nuvem de Livros, desenvolvida por uma equipe multidisciplinar (bibliotecários, publicitários, dentre outro profissionais) e que disponibiliza contos, crônicas e outros tipos de obras literárias, exceto livros didáticos. Como o próprio nome diz, tudo é arquivado e disponibilizado na “nuvem”, além de ser acessível simultaneamente por vários usuários e não possuir problemas de conteúdos indisponíveis. O acesso a nuvem ocorre independentemente de quaisquer critérios sociais, econômicos, políticos ou religiosos e as obras só podem ser lidas no computador por R$0,99 por semana. Conforme Bahiense explicou, esse valor é o “aluguel” da leitura, já que não pode ser feito o download das obras, e também resolve a delicada questão dos direitos autorais, já que um percentual é destinado aos editores e autores. Por fim, foi apresentado que atualmente a Nuvem de Livros já conta com cerca de 40 editoras e que também serão atendidos os critérios de acessibilidade, num primeiro momento com os livros em libras, e posteriormente com outros recursos para atender às demais pessoas com deficiência.
Foi uma mesa bastante instigante, tendo em vista que apresentou conceitos filosóficos, passando pelos direitos autorais e patrimoniais e encerrada com questões ligadas à tecnologia.

Fonte:  Eduardo Graziosi Silva em Bibliotecas 2.0

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