quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

A GUISA DAS VERDADES NÃO DITAS (TADEU FEITOSA)

Recebi um email muito especial do professor Tadeu e faço questão de compartilhar as suas emocionantes palavras com todos.



A GUISA DAS VERDADES NÃO DITAS



São 16h39min de 16 de dezembro de 2009. Uma tarde quente e úmida banha a ideologicamente “Fortaleza Bela”. De volta de um almoço dito “natalino”, fui instado por mim mesmo a responder o ‘real valor’ de ser professor na presença de uma dileta e ex-aluna e eterna amiga.



Não são as instabilidades (?) supostamente etílicas que me ensejam a responder a essas questões, mas um desejo imorredouro de manter-me fiel ao que me sempre impulsionou ser professor.



Depois de vinte anos de sala de aula, posso compreender que era esse o púlpito, o palco, o cenário ou o marco de ‘visibilidade’ que embalava meus sonhos de menino. Foi no devir das relações quentes e sinestésicas das muitas salas de aula que eu pude compreender que – para além do palco – eu desejava o colo, o afago, o mimo, o afeto recíproco e a cumplicidade que minh’alma desejava.



Não existe o professor sem o desejo, nem a vontade e nem a representação que embalam suas inclinações. Não existe esse ser sem as mediações que emanam de minhas vontades do coração. Não sou professor, sou receptor; não sou mestre, sou mediador; não sou doutor, sou paciente. Paciente à procura de colos, de cumplicidades, de afetos tortos, de abraços não dados...



A sala de aula não é o meu lar e nem o meu palco. É meu espaço de interações. Às vezes, tensa. Outras vezes, simples. Mas, interações mediadas, negociadas à luz das minhas necessidades... mais do que das necessidades de meus supostos alunos.



Não modulo minhas aulas pelos rigores dos conteúdos – ainda que eles me rotulem sob o fiel escudo da logo universitária – mas pelas ‘deixas simbólicas’ que emanam dos olhares e seus vieses, das performances e elipses de meus interlocutores.



Quem partilhou comigo uma sala de aula sabe que ali não é meu púlpito, mas minha cama; não é meu palco, mas meu chão; não é meu sim, mas meu também. Não sou professor no singular, porque o singular é solitário e frio. Prefiro o quente do afeto, do afago, do tocar, do “estou aqui” à verborragia professoral, à ‘eloquência’ vazia.




Não tenho alunos, tenho cúmplices. Não tenho súditos, tenho reis. Não tenho interlocutores, tenho ouvidos. Na sala de aula, as letras não falam por mim, apenas fazem sucumbir meus desejos insepultos de partilhar o bem na medida certa dos desejos e vontades dos meus supostos alunos. Não sou um fingidor poético, sou um refém dos meus tesões, das minhas vontades, dos meus desejos.




Não vejo na interlocução a mediação ditatorial das fazeres acadêmicos, mas o desejo da partilha, da troca, de uma negociação que se deseje plena e imorredoura. Meus contatos com as listas de frequência não passam de álibi para eu reificar em mim nomes que se encerram em meu coração, para imortalizarem em mim meus desejos de permanência. De permanecer imorredouro como as epígrafes grafadas nos “meus corações”. Epígrafes em graces, em javes, em gomezz, em guimarães, em câmaras, em neves, em araújos... e tantos outros pseudônimos de radicais ‘biblios’, ‘publs’ e “comunica’s.




Não me submeto às aulas didaticamente bem feitas, mas ao sabor dos olhares, dos sentidos em profusão, dos ares que emolduram cada devir de aulas. Minhas teorias são sinestésicas porque não se desejam declinar aos bolores do tempo ou aos ditames conteudísticos. Minhas teorias são táteis, olfativas, gustativas.




As fronteiras das minhas salas de aulas são desterritorializadas porque circunscritas ao alcance dos meus braços em abraços; dos lugares do meu pensamento; do poder das minhas orações. Meus alunos não sucumbem às chamadas, nem se findam nos semestres, nem se fossilizam nos diplomas finais. Eles permanecem. Eles se recriam. Eles se me complementam. Se há devir no fazer professoral, na minha relação com os alunos há permanência. Não de alunos, mas de partes de mim.




Não há aluno que eu não ame. Há alunos que eu supostamente “esqueci”. Não há alunos que eu desgoste, há alunos com quem eu vacilei. Não há alunos que me odeiem, há alunos que não responderam às minhas “chamadas”. Minha vida de professor é uma vida de chamamentos. Eu chamo aos quais necessito. E eu necessito de todos. Não sou um professor, sou um depósito de vontades.




Não chamo pelo “presente!”. Chamo pelo futuro. Ao chamar meus alunos, é a mim que eu chamo porque eu estou – ou pelo menos desejaria estar – em cada um deles. Dos mais lembrados... dos pouco lembrados... dos esquecidos... (?) dos que ainda virão... sou aquele professor que ama indistintamente... porque não amo o fazer, amo o ser. Não amo o querer, amo o desejar. Não amo apenas o que se foi, amo o que virá.




A guisa das verdades não ditas, sou tudo o que tive a oportunidade de dizer e tudo o que silenciei àqueles que queriam de mim ouvir o que as letras não são capazes de definir. Não sou o professor que pintam, sou o professor que tentei grafar em meus alunos meus mais diletos e sinceros sentimentos.




Não sou professor, sou ator. Um ator limitado que só sabe representar e sentir o AMOR, seja ele assim entendido ou não.


Para meus diletíssimos alunos... de hoje, de ontem e de sempre....


Beijos.
Tadeu Feitosa

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